Nos últimos 12 anos, o Brasil tem enfrentado uma média de quase dois casos por dia de exercício ilegal da medicina, conforme revelado em um comunicado recente do Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgado nesta quinta-feira (21). Esses dados alarmantes emergiram em resposta a uma série de incidentes graves que resultaram em danos sérios e até mesmo morte de pacientes.
Durante o período de 2012 a 2023, o país testemunhou 9.875 ocorrências desse crime, abrangendo não apenas a medicina, mas também áreas como odontologia e farmácia. Os números refletem a abrangência do problema, com 6.189 novos processos registrados nos tribunais e 3.337 boletins de ocorrência apresentados às Delegacias de Polícia Civil. Esses dados foram obtidos em colaboração com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os sistemas judiciais estaduais e as forças policiais civis em todo o país, utilizando os dispositivos da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Entre os estados, o Rio de Janeiro desponta com o maior número de registros, totalizando 937 ocorrências nas delegacias de Polícia Civil, das quais 11 resultaram em fatalidades, com cinco casos na capital fluminense, além de 31 ocasiões de lesões corporais graves. No Judiciário estadual, o Rio também lidera, com 74 processos novos registrados no último ano.
São Paulo aparece em segundo lugar, com 528 ocorrências policiais, predominantemente concentradas em áreas rurais. Minas Gerais segue em terceiro, com 337 casos reportados.
O CFM alerta para a possível subnotificação desses casos, especialmente considerando que cinco estados não forneceram as informações solicitadas: Espírito Santo, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul e Alagoas. Em alguns casos, como o do Rio Grande do Sul, os dados fornecidos foram amplos e não permitiram uma análise específica. Além disso, alguns estados não possuem registros atualizados ou históricos desde 2012.
O exercício ilegal da medicina é tipificado como crime conforme o artigo 282 do Código Penal, sujeito a uma punição que varia de 6 meses a 2 anos de multa.
O presidente do CFM, José Hiran Gallo, enfatizou a importância de conscientizar a sociedade sobre os perigos associados à busca por procedimentos médicos realizados por profissionais não qualificados.
“Em caso de dúvida, é fundamental verificar se o profissional possui registro médico ativo, consultando os sites dos Conselhos Regionais de Medicina ou do CFM. Sempre recomendamos: evite promessas milagrosas, especialmente aquelas veiculadas nas redes sociais”, afirmou Gallo.
Em casos de irregularidades, a orientação é denunciar às autoridades policiais e aos conselhos médicos, a fim de iniciar uma investigação administrativa e encaminhar o caso para as devidas instâncias.
O CFM destacou alguns casos emblemáticos recentes de prática ilegal da medicina que ganharam notoriedade. Em fevereiro deste ano, um dentista foi preso no Recife por ministrar cursos proibidos de reposição hormonal. Em agosto do ano passado, uma investigação foi iniciada em Goiânia após relatos de lesões corporais causadas por uma mulher em clínicas de estética. Na mesma cidade, em novembro, quatro dentistas foram alvo de investigação por realizarem procedimentos estéticos exclusivos de médicos.
Em Coroados, interior de São Paulo, uma mulher foi detida por utilizar ilegalmente o registro profissional de outra médica, chegando a atender 30 pacientes em Unidades Básicas de Saúde (UBS). O caso foi registrado em março deste ano. Em Divinópolis, região centro-oeste de Minas Gerais, uma biomédica foi presa em maio de 2023 por causar a morte de uma paciente durante uma cirurgia ilegal.